25 de maio de 2024

Retrospetiva - Um Livro, Uma Comunidade

 Para assinalar o Dia de África (25 de maio), realizou-se mais uma tertúlia literária, a última deste ano letivo,   no dia 22 de maio, pelas 14h30. A temática das leituras incidiu em livros escritos por Ondjaki uma vez que alunos e professores adquiriram livros aquando do encontro com o autor na escola e manifestaram interesse em lê-los e discuti-los na tertúlia.

A conversa foi animada e motivadora com leituras de excertos.  A realização da tertúlia literária já se tornou uma excelente prática da biblioteca escolar. 
Nesta sessão estiveram presentes 7 alunos, sendo que 4 vieram pela primeira vez e prometeram voltar; 7 professores e dois assistentes operacionais/técnicos. 
Decidiu-se que para o  encontro  a realizar no próximo ano letivo, em outubro, as leituras incidem em biografias/memórias. 
Como já é habitual, finalizou-se a tertúlia com chá e bolinhos. 




Livros lidos:



Opinião


Estas são as primeiras palavras do livro que nos agarra desde o início:

"Se, quando me acordavam, eu me lembrasse do prazer do matabicho assim de manhãzinha, eu acordava bem-disposto. Matabichar cedo em Luanda, cuia! Há assim um fresquinho quase frio que dá vontade de beber leite com café e ficar à espera do cheiro da manhã. Às vezes mesmo com os meus pais na mesa, nós fazíamos um silêncio. Se calhar estávamos mesmo a cheirar a manhã, não sei, não sei."

Bom Dia Camaradas é um romance delicioso. Ondjaki conduz-nos para a sua Luanda dos anos 80. Acompanhamos Ndalu, a criança que com uma linguagem muito própria e encantadora e uma visão ingénua (será?) nos vai narrando o seu entendimento da vida angolana e, por vezes, da portuguesa e nos vai questionando sobre a situação do país, contrapondo o antes e o depois da independência.

“- … tu gostavas quando os portugueses estavam cá?
- É o quê, menino?
- Sim, antes da independência, eles é que mandavam cá. Tu gostavas desse tempo?
- As pessoas dizem que o país estava diferente… não sei…” (p. 17)

É fascinante a escrita de Ondjaki que nos inebria com um linguajar muito próprio e poético. O recurso a metáforas e a sinestesias enriquece e fantasia a realidade difícil; a criação de personagens maravilhosas retrata com subtileza a sociedade angolana. Todas desempenham um papel fulcral no crescimento e na formação de Ndalu.

“Quando o camarada João veio nos buscar, o calor já tava insuportável. Olhei para as árvores, os pássaros estavam lá sentadinhos, não se mexiam, também deviam estar a suar. Do outro lado da rua havia barracas a vender peixe seco, esse sim, quanto mais ficasse ao sol, melhor. Aquele cheirinho abriu-me o apetite, há quem não goste, mas eu acho que o peixe seco cheirava muito bem, parece sumo concentrado de mar.” (p. 63 – Sublinhado meu).

A leitura envolve-nos e imaginamos e sentimos os espaços, o mar “verzul”, o dia-a-dia, em casa e na escola, da criança viva, inteligente e curiosa, tão ávida de saber e de contar estórias. Ondjaki recorre, de forma sublime, à ingenuidade infantil para nos revelar a situação social, económica e política do seu país. Nada é referido explicitamente, mas o leitor consegue inferir facilmente o período narrado.

Recomendo vivamente a leitura deste livro. Diverti-me imenso com as estórias vividas pelo Ndalu com os seus amigos e professores, na escola e com os seus familiares e empregados, em casa.

Graciosa Reis




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